carta sem destinatário: quando o outro não quer ler o que somos.
15.06.25
eu me lembro de escrever inúmeros rascunhos, reescrever palavras e repensar várias partes dos bilhetes. mal sabia eu que, meu esforço não seria compensado simplesmente porque eu tinha a intenção de mostrar o melhor. eu entendi que, talvez ela realmente tivesse me visto e tinha consciência de quem eu poderia ser, mas ela simplesmente resistiu e nunca se abriu para mim.
então eu saí dali.
algum dia por aí, eu pude perceber que existem cartas que escrevemos com as mãos trêmulas, o coração cheio e a esperança encostada na ponta dos dedos, acompanhando a caneta, esperando ser traduzida. a gente dobra o papel com cuidado, sela com afeto e espera. alguém pode abrir. esperamos que alguém abra. também dizemos e colocamos dentro de nós mesmos que estamos aptos e prontos para lidar com as expectativas que colocamos sobre as coisas. mas não é verdade.
mesmo que o tempo passe e os anos se escrevam em nossas expressões faciais, somos humanos que nunca estamos cem por cento preparados para a reação do outro. eu acredito que, mesmo que fique mais velha, ainda estarei aprendendo severamente essa lição. como faço para aceitar esse silêncio tão alto? é como se ela me contasse por telepatia todos os motivos para não estar na minha vida. e eu sinceramente quis mudar isso. eu quis fazê-la mudar de ideia sobre mim mas acho que não posso. não posso e nem devo tentar lhe mostrar isso. ela me deu todos os sinais e eu simplesmente devo pegar a minha passagem agora.
no entanto, ainda existe aquele pequeno resquício de questionamento. o coração tentando entender o que a mente já está gritando há meses.
não há espaço para mim aqui.
essa é a verdade. eu poderia chamá-la de injusta, mas mesmo assim não mudaria um segundo da realidade que me é imposta e, por certas coisas, não vale a pena lutar. não quando não é recíproco. e não posso me desmantelar para pertencer a um lugar em que minha voz não tem vez e não é ouvida. porque deveria tentar? simplesmente não há lugar na mesa. no começo parece até viável tentarmos de novo, acreditando que as nossas cartas vão provocar algum tipo de despertar naquela pessoa, como se ela finalmente fosse te enxergar. o spoiler?
não, ela não vai.
e ela já me mostrou isso de todas as formas.
eu não só quis mudar a ideia dela sobre mim, como também quis me desfazer em pedacinhos e me montar de novo, dessa vez de um jeito que a fizesse me aceitar mais. isso seria demais e com certeza já passei da fase de tentar me provar para as pessoas. simplesmente não tenho mais emocional para isso. acho que é algo bom porque é uma pequena marca da maturidade adquirida pelo caminho mas, por outro lado, é doloroso o replay que muitas vezes a vida nos dá de forma abrupta. levamos esse banque de dor e temos que lidar com ele de forma improvisada. parece demais. não queria sentir isso de novo, em razão de que esses episódios se repetem na minha trajetória e fazem parecer que, a rejeição não só me acompanha como também me mostra que deve ter algo de errado comigo. será que tem mesmo? e se tiver, o que faço?
essa dúvida fica em mim, como uma tatuagem na minha mente, uma vela de aniversário teimosa, que se recusa a apagar na hora que o turbilhão de emoções passou. eu tento interpretar os fatos de todos os ângulos possíveis e isso parece multiplicar minhas lentes de contato e no máximo, torná-las um pouco mais turvas de neblina. é confuso. não é como se ela me desprezasse, não é isso. mas a minha presença não é querida nem valorizada. não há interesse em me conhecer de uma maneira mais profunda. talvez tentar ver as coisas pelo lado dela seja um caminho.
talvez o erro não seja exatamente quem eu sou, mas o que eu represento na vida dela. não estou tentando ser ninguém, apesar de ter as minhas questões. eu só queria ser eu, em uma nova circunstância, mas verdadeiramente aceita e querida. mas, tentar me provar constantemente neste caso seria como escrever inúmeras cartas sem destinatário. sabem que você as tem, sabem que são belas, possantes de conteúdo relevante mas eles simplesmente não se interessam pela leitura das mesmas, não por odiar cartas mas porque aquilo faz parte deles e talvez, tendo consciência disso, eles ainda escolham ler cartas que carreguem outro tipo de mensagem. não tem como desconvencê-los disso. é o que é. me desanimo com isso mas nada tenho a fazer com fatos fora do meu alcance. isso a própria filosofia estoica doutrina.
aqui formulo então minhas questões: devo olhar para dentro com mais gentileza e acolhimento? como eu aceito que não me querem por perto? como eu aceito que não querem me conhecer e ter, ali, no meio social de um grupo que carrega uma história fechada? estou sendo infantil ou hipócrita ao sentir isso? preciso entender. essa excursão de vivências desconfortáveis talvez me trará um senso de amor-próprio e identidade mais forte. talvez eu precise ou mereça. talvez eu demore a entender. talvez eu nunca entenda.
no fim, a maior aceitação que posso alcançar não está na aprovação dela e na possibilidade ilusória dela ler as minhas cartas, mas na paz silenciosa de ser fiel a mim mesma — mesmo quando ninguém no mundo me quiser por perto. nem todo lugar é feito para mim e não há problema nenhum nisso.
Comentários
Postar um comentário